Para o juiz, embora a empresa tenha errado ao preencher declarações de importação, não houve prejuízo ao controle aduaneiro
A Justiça Federal concedeu liminar à TAM Linhas Aéreas S/A, suspendendo a cobrança de multa aduaneira de R$100 milhões, em valores atualizados. Ao conceder a tutela, o juiz Guilherme Mendonça Doehler, da 10ª Vara Federal Cível de Belo Horizonte, do Tribunal Regional da 6ª Região (TRF6), argumentou que, embora a empresa tenha errado ao preencher declarações de importação, não houve prejuízo ao controle aduaneiro.
Outro ponto levado em consideração pelo magistrado foi que no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) a multa foi mantida pelo voto de qualidade, que é o peso duplo do voto dos presidentes de turmas no Carf quando há empate sobre alguma questão.
O magistrado argumentou que o critério de desempate, restabelecido há alguns dias pelo governo federal, por meio da Medida Provisória (MP) 1.160/2023, é “polêmico”.
A TAM havia recebido multa aduaneira correspondente a 1% do valor de aeronaves e peças importadas por deixar de informar, em declarações de importação, que a empresa exportadora, a Latam Airline Group, era uma companhia do mesmo grupo.
No entanto, para Guilherme Doehler, a vinculação entre as empresas estava expressa em outros documentos aos quais a fiscalização teve acesso, além de ser fato de conhecimento público e notório. O magistrado, assim, entendeu que o pedido da empresa era plausível e que o não deferimento poderia levar a dano irreparável ou de difícil reparação.
Segundo ele, embora a multa tenha sido aplicada de acordo com o parágrafo 3º do artigo 113 do Código Tributário Nacional (CTN), que estabelece que o descumprimento de obrigação acessória provoca sua conversão automática em obrigação principal, em relação à penalidade pecuniária correspondente, e, ainda, com o artigo 136, que prevê que não é necessária a intenção do contribuinte para que se configure a infração, o caso concreto tem peculiaridades.
“A situação revela algumas peculiaridades que devem ser consideradas, (…) destacando-se o fato de que o equívoco praticado, ao que tudo indica, pode ter sido derivado de erro material, haja vista que, conforme salientado pela própria fiscalização aduaneira, a documentação apresentada juntamente com a declaração revelava farta e claramente a existência de vínculo entre as empresas, que, aliás, era fato público e notório”, afirmou.
Com a liminar, o fisco fica impedido de cobrar e adotar medidas restritivas contra a empresa, como inscrição do débito em dívida ativa, até que seja julgado o mérito da questão.
Para os Advogados, que representou o contribuinte no processo, a decisão do juiz foi importante porque levou em conta aspectos fáticos do caso concreto. “O juiz foi bem ao cerne da questão. Ele disse que não é uma situação normal, que acarretaria a aplicação da penalidade. Foi uma situação bem específica”, comentou.
Para a advogada , caso a decisão de Doehler seja mantida no julgamento de mérito, será um precedente importante no TRF6, que começou a funcionar há pouco tempo abrangendo os processos de Minas Gerais, após um desmembramento do Tribunal Federal da 1ª Região (TRF1).
“É um julgado novo para o TRF6, mas já tínhamos observado esse mesmo comportamento, de o magistrado e os desembargadores aprofundarem o estudo para verificar se houve efetivo embaraço ao controle aduaneiro. O TRF4 [Tribunal Regional da 4ª Região] já tem decisões nesse sentido”, afirmou.
Voto de qualidade
Outro ponto levado em consideração pelo magistrado foi o fato de que a empresa recorreu ao Carf, tribunal administrativo que analisa recursos envolvendo atos da Receita Federal, e, lá, a multa foi mantida em turma ordinária com a aplicação do voto de qualidade. A Câmara Superior de Recursos Fiscais, instância máxima do tribunal, não conheceu do recurso.
Segundo Doehler, o voto de qualidade é “instrumento de grande polêmica”, pois segundo o juiz, alega-se que seria uma violação ao artigo 112 do CTN, o qual prevê que, em caso de dúvida sobre fato tributário, a interpretação deve ser solucionada em favor do contribuinte.
Neste ano, o voto de qualidade voltou a ser o único critério de desempate no Carf após o governo federal editar a MP 1.160/2023, acabando com o desempate pró-contribuinte, critério que havia sido adotado com a lei 13.988/2020.
A decisão gerou críticas e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) anunciou que vai propor Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ao Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a medida.
Fonte : JOTA.
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