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STJ firma entendimento contra sucessão criminal entre empresas


Decisão inédita foi proferida pela 3ª Seção, que reúne as turmas de direito penal


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não há sucessão criminal entre empresas. Nas operações de incorporação, em que a sociedade incorporada é extinta, a incorporadora não pode ser responsabilizada pelo crime.


A decisão é inédita na Corte e, segundo advogados, favorece os negócios.


Foi proferida pela 3ª Seção na última quarta-feira. O colegiado uniformiza o entendimento a ser adotado nas duas turmas especializadas em direito penal do tribunal. A primeira e a segunda instâncias, além disso, costumam levar essas decisões em conta nos seus julgamentos.


“Era um entrave para as transações. Agora o comprador terá mais segurança. Não vai ter medo de ser responsabilizado por um fato que ocorreu no passado e que não teve nenhuma participação”.


O caso analisado pelos ministros - e que servirá como precedente - envolve a Seara Alimentos, controlada pelo Grupo JBS. O Ministério Público do Estado do Paraná tentava com que a empresa respondesse por uma denúncia de crime ambiental contra a Agrícola Jandelle, adquirida pela Seara em 2014 e incorporada em 2018, quando deixou de existir.


Pela lei brasileira, o crime ambiental é o único que pode gerar responsabilidade penal a empresas. Nos demais, só os gestores respondem.


A companhia, nesses casos, pode ser condenada a prestar serviços à comunidade (custeando projetos ambientais, recuperando áreas degradadas ou com a manutenção de espaços públicos), interdição temporária, suspensão parcial ou total das atividades, pagamento de multa e proibição de contratar com o poder público ou obter subsídios, subvenções e doações.


A decisão que livrou a Seara foi proferida voto a voto. O placar fechou em cinco a quatro, cabendo ao presidente da Seção, ministro Reynaldo Soares, bater o martelo. Ele acompanhou o entendimento do relator, o ministro Ribeiro Dantas, que equiparou a situação de empresas extintas a de pessoas físicas que morrem no curso da persecução penal.


A Constituição Federal prevê, no artigo 5º, que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado” e o Código Penal, no artigo 107, reafirma: “extingue-se a punibilidade pela morte do agente”.


A Seara foi notificada da denúncia no ano de 2018 e ingressou com um mandado de segurança com base no artigo 107. Não teve êxito na primeira instância, mas conseguiu reverter a decisão no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR).


Os desembargadores determinaram o trancamento da ação penal com o fundamento de que a Agrícola Jandelle, por estar extinta - devido à incorporação -, havia perdido a capacidade de estar em juízo como parte passível de punição. Eles levaram em conta, além disso, o princípio constitucional da “intranscedência da pena”, de que só o autor pode ser responsabilizado pelo crime que cometeu.


O Ministério Público recorreu, então, ao STJ (REsp 1977172). Esse caso estava na 5ª Turma e os ministros optaram por afetar para julgamento na Seção. A procuradora Mônica Nicida Garcia falou aos magistrados naquela oportunidade - dia 10 de maio.


“Os pressupostos da responsabilidade penal da pessoa jurídica são distintos da pessoa física. Não se pode transpor garantias destinadas aos seres humanos em modo equivalente aos entes coletivos”, defendeu.


Já o advogado Rodrigo Castor de Mattos, representante da Seara no caso, que também se manifestou naquela ocasião, chamou a atenção de que a denúncia oferecida em 2018 remetia a suposto dano ambiental ocorrido pela Agrícola Jandelle no ano de 2008 - uma década antes.


“A empresa adquirente sequer tinha conhecimento da presente demanda”, frisou. “A Jandelle foi adquirida pela Seara em 2014 e em 2018 incorporada por outra empresa do grupo, resultando em sua baixa, de forma cem por cento regular.”


O ministro Ribeiro Dantas, relator do caso, enfatizou em seu voto, na sessão de quarta-feira, que só estava decidindo contra a sucessão da responsabilidade penal por não haver indícios de fraude no caso.


“Extinta legalmente a pessoa jurídica ré, sem nenhum indício de fraude, como afirma o acórdão recorrido, aplica-se analogicamente o artigo 107 do Código Penal, com a consequente extinção de sua punibilidade”, afirmou.


Além do presidente da Seção, acompanharam o entendimento do relator os ministros Olindo Menezes, Jesuíno Rissato e Sebastião Reis. “Não cabe dizer que houve uma assunção criminal. Isso inclusive geraria desconforto na ação penal porque teria que mudar a parte ré de Agrícola Jandelle para Seara Alimentos. Isso também é difícil no direito penal”, observou Olindo Menezes.


O grupo divergente seguiu a linha de que a extinção da punibilidade poderia servir como incentivo para que as empresas se utilizem de artifícios societários para escapar da lei. E mesmo os casos regulares, na visão dos ministros, acabam servindo como obstáculo para a aplicação da legislação.


“A união de esforços em busca de melhor competitividade não pode fulminar o comando máximo do caráter ressocializador das penas, que é o principal objetivo da sanção penal no Brasil”, disse o ministro Joel Ilan Paciornik, que abriu a divergência.


Além dele, votaram a favor da sucessão criminal os ministros Antônio Saldanha Palheiro, João Otávio de Noronha e Rogério Schietti.


O Ministério Público ainda pode apresentar, na 3ª Seção, o recurso de embargos de declaração. Serve para casos de dúvidas, omissões ou obscuridades que possam existir no acórdão, mas não muda o mérito.


O Valor apurou, além disso, que como há questão constitucional envolvida, o tema poderá ser levado aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).


Fonte : Valor Econômico.

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