Benefício fiscal alivia carga tributária para paisagismo de empreendimentos imobiliários e campos de golfe
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu aval à isenção de ICMS na compra, realizada dentro do Estado, de uma série de produtos químicos usados na fabricação de fertilizantes.
Ao contrário do que defende a Fazenda paulista, os desembargadores entenderam que o benefício não vale apenas para os adubos destinados à produção de alimentos (agricultura intensiva).
Na prática, além de incentivar a fabricação de fertilizantes em São Paulo, a decisão garante a isenção a produtos destinados a empresas de jardinagem e paisagismo - para uso em arranjos florais, campos de golfe ou empreendimentos imobiliários, por exemplo. No caso concreto, foi beneficiada uma fábrica de fertilizantes de Cerquilho, no interior paulista.
O cerne da questão é o artigo 41 do Anexo I do Regulamento do ICMS (RICMS). De acordo com o dispositivo, há isenção nas operações internas realizadas com os insumos agropecuários listados, “desde que se destinem quaisquer desses produtos à utilização na produção agrícola ou à fabricação de adubo simples ou composto, ou de fertilizante”.
A batalha pelo reconhecimento do direito à isenção fiscal foi dura. Apesar de haver, desde os anos 90, várias respostas da Fazenda paulista favoráveis à isenção em qualquer circunstância, um fiscal de Itapetininga (SP) teria resolvido adotar um entendimento diferente. “Limitou o benefício apenas à aquisição por produtores agrícolas”, conta Antônio Carlos Moura, um dos advogados que representam a fabricante de fertilizantes.
A Fazenda de São Paulo passou então a adotar o entendimento de que o benefício só seria aplicável nas vendas realizadas diretamente a empresa ou produtor rural, como insumo na agricultura intensiva. No ano passado, por meio da Consulta Tributária nº 23169, chegou a responder que fertilizantes destinados a jardinagem e paisagismo não poderiam ser contemplados com a isenção.
A discussão sobre a mudança de entendimento do Fisco paulista foi parar no Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) - que analisa recursos de contribuintes contra autuações fiscais. “Em 2016, ganhamos no TIT por 4 a 0”, afirma Moura. “Mas a Fazenda levantou a bandeira da tese limitadora da isenção e saímos derrotados na última instância [Câmara Superior do TIT], por estreitíssima margem”, acrescenta. O placar do julgamento fechou em 8 a 7.
Inconformada, a fábrica propôs no Judiciário ação anulatória de lançamento fiscal. No processo, os advogados da empresa apresentaram o Convênio nº 100, de 1997, do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), órgão que reúne os secretários da Fazenda estaduais do país.
A norma autoriza a redução da base de cálculo do ICMS, nas operações interestaduais, de uma lista de produtos “para uso na agricultura e pecuária, vedada a sua aplicação quando dada ao produto destinação diversa”.
Para complementar, expuseram na Justiça a definição do conceito de agricultura. “A lei não define o que é, mas a ciência sim: o desenvolvimento do ciclo biológico”, diz Moura. “Por isso, não importa se o fertilizante vai ser usado para um jardim, campo de golfe ou a produção de alimentos.”
No TJSP, a fabricante de fertilizantes venceu a disputa na 3ª Câmara de Direito Público por 4 votos a 1. “A legislação sobre o ICMS não vincula a isenção dos fertilizantes à sua utilização na agricultura. Isso vem expresso no artigo 41 citado, que estabelece isenção em três situações: Quando houver utilização na produção agrícola; quando ocorrer a fabricação de adubos simples ou composto; quando se der a fabricação de fertilizante”, diz o voto do relator, o desembargador José Luiz Gavião de Almeida (apelação cível nº 1007563-68.2020.8.26.0053).
Não cabe mais recurso da decisão (transitou em julgado). “Agora vamos pedir a devolução do que a empresa pagou indevidamente nos últimos quatro anos, de 2018 a 2021”, afirma Moura. “Além disso, outros contribuintes poderão usar a decisão na argumentação de ação judicial própria para tentar obter o mesmo direito”, acrescenta.
A isenção de ICMS prevista no artigo 41 do Anexo I do RICMS/SP para fertilizantes e produtos correlatos foi revogada em 2021. Atualmente, tais produtos fazem jus à redução da base de cálculo, nos termos do artigo 77, inciso II, do Anexo II do RICMS/SP.
O advogado, que também representou a fabricante de fertilizantes no processo, explica que a redução da base de cálculo do ICMS é benefício idêntico ao do dispositivo revogado. “Portanto, os fundamentos da decisão do TJSP continuam válidos e relevantes para os fabricantes defertilizantes que destinem seus produtos às atividades de jardinagem e paisagismo”, afirma o especialista. “A decisão ganha relevância diante da posição que vem sendo construída no âmbito da Secretaria da Fazenda paulista.”
Para as advogadas, a decisão é relevante porque protege a venda de fertilizantes, mesmo que a finalidade não seja para o cultivo de alimentos. “Em várias hipóteses de isenção, o Fisco procura de certo modo mitigar o benefício fiscal, alegando que deve ser sempre interpretado literalmente”, diz Fernanda. “Contudo, interpretar benefício fiscal literalmente, como determina o Código Tributário Nacional, não pode significar uma indevida limitação na aplicação dos mesmos benefícios”, acrescenta.
Por meio de nota, a Procuradoria Geral do Estado (PGE-SP) afirma que não identificou hipótese de recurso aos tribunais superiores no caso concreto, “tendo apresentado as impugnações cabíveis ao TJSP”.
Fonte : Valor Econômico.
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