Número de acordos firmados com a Fazenda Nacional atingiu a marca de 1,1 milhão em abril
O número de acordos fechados por empresas e pessoas físicas com a União para pagamento de dívidas fiscais atingiu a marca de R$ 1,1 milhão no mês de abril - somando R$ 263 bilhões em valores negociados. Os contribuintes vêm se valendo da chamada “transação tributária”, que permite à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) conceder descontos e parcelamentos.
Essa modalidade existe há pouco mais de dois anos. Foi instituída em fevereiro de 2020, por meio da Lei nº 13.988. O Fisco, desde então, tem permissão para sentar à mesa e negociar - inclusive dívidas de altíssimo valor.
A Universidade Candido Mendes, por exemplo, fechou acordo há poucos dias para regularizar um passivo de R$ 1,25 bilhão. Foi a maior quantia negociada pela equipe da procuradoria na 2ª Região, que abrange os Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo.
Em São Paulo, casos bilionários vêm sendo registrados desde o ano passado. O Grupo Ruas, que atua no transporte urbano, fechou acordo para pagamento de R$ 3,12 bilhões no mês de julho. Já a Inepar, do setor de infraestrutura, formalizou a renegociação de R$ 2,6 bilhões de dívidas fiscais em dezembro.
Funciona de forma diferente do que se via nos parcelamentos do tipo Refis, que previam uma modelagem única de descontos e parcelamentos. Ou seja, um só cálculo para todos os contribuintes do país que quisessem aderir.
Nas transações, os acordos são “sob medida” - para um conjunto específico de contribuintes ou de forma individualizada. O desconto e o valor da entrada e das parcelas, nesses casos, variam conforme o fluxo de caixa e a capacidade de pagamento.
“A transação considera a efetiva situação econômica do contribuinte. É a única política pública capaz de permitir a regularização com respeito aos princípios da igualdade, da Justiça e da livre concorrência”, diz o procurador João Grognet, coordenador-geral de estratégias de recuperação de créditos da PGFN.
Existem diferentes modalidades. Mais de dez. Em uma delas, chamada de transação individual, o Fisco e o contribuinte sentam à mesa para negociar. É destinada para aqueles que têm dívidas de mais de R$ 15 milhões. Foi o modelo utilizado tanto pela Candido Mendes como pelo Grupo Ruas e a Inepar.
Os descontos, em regra geral, são de até 50% e a dívida pode ser parcelada em um prazo máximo de 84 meses. Empresas em recuperação judicial - caso da Inepar e da Candido Mendes - têm mais vantagens. Os descontos podem alcançar 70% e o prazo de pagamento vai a 120 meses.
Pessoas físicas, micro e pequenas empresas, instituições sem fins lucrativos e de educação são ainda mais favorecidas. Se encaixam no percentual mais alto, de 70%, e podem parcelar as dívidas em até 145 meses.
A Universidade Candido Mendes, além de estar em processo de recuperação, cumpre os requisitos para aproveitar a melhor condição de pagamento. A dívida original, de R$ 1,25 bilhão, com o acordo, foi reduzida para cerca de R$ 400 milhões. A quitação ocorrerá em 145 meses.
As outras modalidades de transação disponíveis aos contribuintes têm condições predeterminadas em um edital ou portaria e funcionam por adesão. Nesta semana, por exemplo, foi lançado edital para a negociação de discussões sobre amortização de ágio que estejam na esfera administrativa ou judicial.
Esse litígio, segundo a Receita Federal, envolve em torno de R$ 150 bilhões. Quem optar pelo acordo, precisa desistir do processo. Há previsão de descontos de até 50% e o prazo de adesão se encerra em 29 de julho.
Antes, em 30 de junho, há previsão de encerramento de prazo de uma leva de outras transações. Dentre elas, duas pioneiras, instituídas durante a pandemia. A chamada de extraordinária permite o pagamento da dívida com entrada em três vezes e o restante em 81 prestações - ou 142 se for pessoa física.
A outra, denominada excepcional, possibilita o pagamento das dívidas em 84 parcelas ou 145 se for pessoa física, com entrada reduzida e diluída em 12 meses e descontos de até 70% em multas e juros.
A transação individual - direcionada aos contribuintes que têm dívidas de valor elevado - não tem prazo para que os acordos sejam propostos. E funcionam de forma mais customizada.
“Conseguimos ajustar de acordo com a condição econômica de cada devedor”, diz Tiago Voss dos Reis, procurador-chefe da unidade virtual da procuradoria na 2ª região. Ele e a procuradora Andréa Borges Araújo estiveram à frente das negociações com a Candido Mendes.
A universidade, por exemplo, nos dois primeiros anos, vai pagar parcelas mensais menores. Ficou acordado dessa forma para conciliar os pagamentos à União com os compromissos assumidos no processo de recuperação judicial.
A partir do terceiro ano do acordo, com o caixa menos comprometido, o valor das parcelas aumenta. Ainda assim, em formato customizado: serão 11 prestações ordinárias, que representarão 0,5% da dívida, e uma extraordinária, que corresponderá a 7%. Essa, de valor elevado, é chamada de “prestação balão” - serve como reforço ao pagamento.
Essas prestações de alto valor estão relacionadas à venda de imóveis da universidade. A Candido Mendes tem um plano de desinvestimento em curso e a expectativa é de que as vendas sejam realizadas antes dos vencimentos acordados com a União. Se não der tempo, no entanto, terá que pagar a quantia da mesma forma.
A universidade ofereceu outros imóveis e ativos como garantia ao pagamento. E, além disso, dois gestores constam como fiadores da dívida. Se a Candido Mendes não cumprir o acordo, terão que responder com o patrimônio pessoal.
Havia dívidas tributárias e previdenciárias acumuladas desde os anos 1980. “Era acompanhada há muito tempo pela procuradoria. Com a transação, além da perspectiva de pagamento, nós reduzimos litigiosidade”, afirma a procuradora Andréa Borges Araújo.
Celso Viana, pró-reitor jurídico da Candido Mendes, vê a transação como um grande feito. A universidade está em processo de reestruturação societária, para se transformar em empresa - hoje responde como sociedade sem fins lucrativos - e a regularização fiscal, diz, solidifica esse processo. “Traz total segurança para potenciais parceiros investidor
Para ele, a negociação do passivo fiscal consolida a viabilidade do processo de recuperação e “comprova a plena capacidade da instituição de quitar todas as suas dívidas”. As negociações com a PGFN foram encabeçadas pelo advogado.
Só ficaram de fora do acordo as dívidas relacionadas ao FGTS. Essa questão está sendo discutida judicialmente. A Candido Mendes fechou acordo de pagamento com os trabalhadores no processo de recuperação judicial. A PGFN, no entanto, entrou com recurso porque os descontos acertados ficaram acima do limite permitido pela resolução do Conselho Curador do FGTS.
Hoje, vale decisão do juiz da recuperação judicial em favor da Candido Mendes. Inclusive, com determinação para a emissão da certidão de regularidade.
Fonte : Valor Econômico.
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